terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Os Meus Domingos Foram Mais Belos Que os Vossos!

Esta é uma história sobre o tempo em que o futebol era ao Domingo à tarde!
Era a época dos dois canais da RTP e em que a televisão por cabo era quase ficção científica.
No inverno os jogos começavam às três da tarde e no verão eram às cinco, não tinha nada que enganar! À noite, só em jogo com os "grandes" e tinha de ser o escolhido para ser o único que era transmitido em cada jornada no 2º canal. Mas esses, eram muito poucos, e isso também os tornava especiais!
Estávamos na época em que os árbitros auxiliares eram os "bandeirinhas" e os os mais velhos nos lembravam que o futebol tinha sido inventado pelos ingleses quando lhes gritavam:

- Não vês que o gajo está "offside"? Ó seu  ##%$&§&$ !!!!!

Basicamente, Domingo era futebol. Até à hora do jogo,  "matávamos" o tempo a jogar lá no bairro, enquanto nos imaginávamos na pele dos craques. Eu era o Radi, claro, mas havia que preferisse ser o Slavkov e ás vezes lá éramos obrigados a ser o Fonseca, quando tínhamos que ir à baliza!
Naquele campo que era uma estrada asfaltada (ou de "piche", como alguns lhe chamavam), as horas iam passando entre interrupções para que os carros passassem e eternas discussões sobre se a bola tinha entrado ou não, depois de bater numa das pedras que faziam de baliza:

- Não entrou nada, passou por cima da pedra!
- És maluco? bateu na pedra e entrou!

Sabíamos a hora do jogo estava a chegar à medida que ia passando cada vez mais gente de cachecol ao pescoço, daqueles de "lã" com o G.D. CHAVES impresso a tinta e umas franjinhas nas pontas! Havia também uma versão em seda que fez sucesso!
Começava também a ouvir-se lá ao fundo, o quase imperceptível som (ruído seria uma definição mais apropriada!) das "cornetas" de donde invariavelmente saia este anúncio da boca do "speaker":
"Se vai para o mar prepare-se em terra, se vai para a estrada prepare-se na oficina ......!!!!" (infelizmente não me lembro do nome da oficina, ou talvez nunca o tenha percebido realmente, tal era a qualidade do som!).
Era sinal de que estava na hora, para mim tinha acabado a brincadeira e era tempo de ir até ao Municipal, para atalhar, atravessava pelo descampado da feira, por entre os carros estacionados, onde por vezes se viam senhoras de meia-idade, ás vezes com os filhos, a tricotar qualquer coisa. Eram as mulheres dos adeptos da equipa visitante, quem sabe vindos de Covilhã, talvez até de Elvas! Lembro-me de ficar a pensar o que levava aquelas almas a ficar ali fechadas, à espera dos maridos, durante duas horas.
Antes de chegar ao estádio ainda se passava ao lado das "roulottes" onde homens de bigode afinavam as gargantas com a última "Super Bock". (Última fora do estádio, que nesse tempo também se podiam vender lá dentro).
Até aos 12 anos a entrada era gratuita. Depois foi preciso desenvolver técnicas para entrar "à borla".
Como não havia torniquetes e os "cobradores de bilhete" tiravam a idade pela "pinta" ainda deu para entrar durante mais uns tempos de graça, baixava a cabeça, não era nada comigo e entrava! Se o porteiro "topava" e não me deixava entrar, passava-se ao plano B!! Ia até ao portão ao lado e a técnica era entrar "encostado" a uma grupo de dois ou três homens de maneira a que o porteiro pensa-se que eu vinha com eles, via-se que tinha mais de 12 anos mas ia a acompanhar dois ou três pagantes, e a coisa passava. Lembro-me de algumas vezes em que os senhores a quem me "colava" se aperceberam e até me punham a mão por cima do ombro para dar mais credibilidade!
Só quando não deu para disfarçar mais é que me rendi e lá fui até à rua de Santo António, onde era a sede, e paguei os cinco contos pelo cartão de sócio "jovem". Deixar de ir à bola é que nem pensar!
Com maior ou menor dificuldade, lá estava eu no Topo Norte. Cadeiras nas bancadas? Isso era p'ra meninas!! A bola via-se em pé! Ou sentadinho directamente no "cimento"!
Escolher o lugar também tinha o seu "quê"! Convinha ficar mais ou menos perto de algum velhote a ouvir o seu transístor para saber como iam os resultados nos outros campos, e de vez em quando lá se escutava:

- Olha....Golo do Varzim!
- Está a jogar contra quem?
- Contra o Beleneses, em casa.
- Dava jeito era que empatassem.....

Fosse contra quem fosse, estávamos na era do estádio cheio, a equipa raramente desiludia, e a claque, a Fúria Azul-Grená, era toda uma cidade!
O jogo acabava, mas o futebol não! Ainda havia a ansiosa espera para ver o resumo do jogo, à noite,  no tardíssimo Domingo Desportivo, para tirar dúvidas se "aquela" jogada tinha sido penalty!  (mas essa, é outra história!)

É por isso que posso dizer, sem qualquer dúvida, que nesse tempo...........Os Meus Domingos Foram Mais Belos Que os Vossos!!!!





8 comentários:

  1. Também sou desse tempo. Saudades não é?

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  2. "Se vai para o mar prepare-se em terra, se vai para a estrada prepare-se na oficina ......Joaquim Batista e Filhos Lda"

    Grandes tempos.......

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  3. tb vivi isso e sinto orgulho nessa infancia!

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  4. Caro Anónimo de Feb 4, 2012 03:47 AM
    Estou a ver que tiveste a sorte de viver aqueles momentos mágicos! Obrigado por me recordar o nome da oficina!!

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  5. Caros Anónimo Feb 2, 2012 03:15 AM
    e Anónimo Feb 5, 2012 06:29 PM

    Obrigado por visitarem e comentarem o blog!

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  6. Felizmente recordo com grande orgulho aqueles tempos. Na altura era um menino dentre oa 10/12 anos. Mas lembro-me da oficina simplesmente porque na altura o meu pai trabalhava lá.

    Muito bom o texto. Obrigado pelo texto que retrata na exactidão aquilo que vivi, que sinti (e muitos outros flavienses também) e que muito dava para tornar a sentir.

    Este texto já está referenciado no grupo do facebook "aconteça o que acontecer sou do Chaves (GDC) até morrer"....

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  7. Bom texto, e eu ainda me lembro de ir domingo de manha ao Faustino, onde se lavava o carro e bebiam uns canecos. No estádio a compra das almofadas, e no final do jogo atiravam-se para o campo. A bancada antiga, batia-se nas chapas e era uma barulheira.... Bons tempos....

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  8. Que saudades...Ao ler este texto,voltei aos meus tempos de jovem. Relembrei os Domingos que ia com meu pai ao estádio, e nem pensar falhar, era obrigatório ir...Está tão bem escrito que faz relembrar esses momentos...

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